quinta-feira, 26 de setembro de 2013

MINHA CASA MINHA DÍVIDA - ARTIGO DA REVISTA VEJA



Notícia da revista VEJA edição 2340 de 25 de setembro de 2013. 

DÍVIDA SUFOCA FAMÍLIAS DO MINHA CASA, MINHA VIDA

Vitrine do governo Dilma para 2014, programa que pretende entregar moradias populares a 3 milhões de famílias até o fim do ano tem recorde de inadimplência


 Ele foi planejado para ser a mais vistosa vitrine eleitoral da gestão Dilma Rousseff – a resposta do governo para o sonho da casa própria. Lançado em 2009, o programa Minha Casa Minha Vida consumiu 134,5 bilhões de reais para fazer 2,1 milhões de casas populares. O primeiro milhão já foi distribuído. A presidente Dilma já percorreu seis estados brasileiros neste ano para providenciar ela mesma a entrega, O potencial de dividendos eleitorais da iniciativa é tamanho que ela é tratada como uma espécie de Bolsa Família da área urbana. 

Programa subsidiado, o Minha Casa minha Vida prevê que o governo arque com uma parte das prestações e o beneficiado banque o restante. O valor das parcelas é calculado com base na rende da cada família. No papel, tudo certo. Na realidade, tudo mais ou menos. Dados obtidos por veja revelam que o índice de inadimplência na faixa de financiamento que inclui participantes com renda mensal mais baixa, até 1600 reais, está em 20%. É um número dez vezes maior que a média dos financiamentos imobiliários no Brasil e 4 pontos mais alto que a porcentagem de atrasos em pagamento de hipoteca nos Estados Unidos em 2007, quando se acentuou a crise que serviu de gatilho para a pior recessão desde o fim da II Guerra Mundial. O programa de habitação do governo tem 270 000 famílias na faixa de renda mais baixa e 1 milhão nas duas faixas seguintes. Nas duas últimas, a taxa de inadimplência está na média do mercado. A Caixa só divulgou estes dados depois de a reportagem de Veja entrar com recurso junto à Controladoria-Geral da União. Antes disso, o pedido, feito com base na Lei de Aceso à Informação, havia sido negado duas vezes. 

 O fato de uma porcentagem tão extraordinariamente alta de participantes do programa não estar conseguindo pagar as prestações significa que sua capacidade de pagamento foi mal avaliada. Se essa má avaliação ocorreu por incompetência ou estratégia é difícil saber. Cinco de seis moradores ouvidos por veja em dois conjuntos habitacionais do Minha Casa Minha Vida em São Paulo contaram que não tiveram nenhuma dificuldade para serem aceitos pelo programa, ainda que não tivessem emprego fixo e não pudessem apresentam comprovante de renda. Todos disseram ter sido incluídos depois de aprovados com base no mesmo método: apresentaram uma “estimativa” de quanto ganhavam e a prestação foi fixada em 10% desse valor declarado. Todos estão inadimplentes há pelo menos 10 meses. 

 Essa arquitetura financeira ruinosa obriga o setor produtivo a bancar a conta para manter o programa em pé. Na última quarta-feira, em votação no Congresso, o governo conseguiu manter a multa adicional de 10% do Fundo de Garantia de Tempo de Serviço (FGTS) paga pelas empresas nas demissões sem justa causa. O dinheiro será usado exclusivamente para financiar o minha Casa Minha Vida. É o processo que o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore descreveu bem: o governo “compra” o eleitor à vista e obriga a sociedade a pagar por ele a prazo. O valor dos financiamentos do Minha Casa Minha Vida com atraso superior a noventa dias já beira os 2 bilhões de reais na faixa mais baixa de renda, o equivalente a tudo que o governo repassou para as universidades federais no ano passado. 

 Mas os beneficiários inadimplentes do programa não correm o risco de perder o imóvel. A reintegração de posse não está entre as medidas do governo para evitar os calotes. “Como se trata de política habitacional para a população de baixo poder aquisitivo, o monitoramento da inadimplência nesta faixa tem por objetivo principal auxiliar o beneficiário a encontrar soluções para manter a posse do imóvel”, informaram a Caixa e o ministério das Cidades. O resultado desta estratégia é mais inadimplência, como explica o consultor em assuntos bancários Roberto Troster, ex-economista-chefe da Federação Brasileira de Bancos (Febraban); “Se um em cada cinco fica sem pagar e nada acontece, isso vira um incentivo para que outros façam o mesmo. Ninguém é contra um sistema habitacional. Mas ele precisa de boa execução, e existem mecanismos para incentivar a responsabilidade financeira”. 

 Além de não cobrar a dívida para valer, o governo vem se esforçando para piorar o endividamento das famílias. Em junho, lançou o Minha Casa Melhor, uma linha de crédito de te 5000 reais para a compra de móveis e eletrodomésticos dos participantes do Minha Casa Minha Vida. Até agora, a Caixa já distribuiu mais de 1 bilhão de reais, aparentemente, com o mesmo grau de rigor que usou no programa de habitação: não é preciso comprovar renda para ter acesso à nova linha de crédito. O governo poderia simplificar as coisas e jogar dinheiro direto do alto de um avião. Sairia mais barato para o contribuinte. 

Colaborou Natália Cacioli.


FONTE: REVISTA VEJA


MARCADORES: PERUÍBE, PERUIBENSE, MERCADO IMOBILIÁRIO, BOLHA IMOBILIÁRIA


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