sexta-feira, 25 de junho de 2010

Coréia do Norte: o interminável drama da fome ajuda a livre iniciativa



A Coréia do Norte está passando, como tantas outras vezes, por mais um agravamento da escassez de alimentos. O próprio governo reconheceu o fracasso do seu programa de racionamento alimentar. Desde o final de maio, está sendo permitido o funcionamento dos mercados livres - onde as pessoas podem comercializar de forma "não-socialista" - por 24 horas, ou seja, não precisam fechar.

 Uma organização de direitos humanos chamada Good Friends informou essa decisão no dia 14 de junho. De acordo com a Good Friends, a orientação governamental foi resultado de uma decisão tomada em 26 de maio, o que permitiu que os mercados permaneçam abertos e que orienta os norte-coreanos para comprarem sua própria comida.

Tal ordem na prática reconhece que a escassez de alimentos continua a se agravar  nos últimos seis meses, em parte por causa da fracassada reforma monetária, a qual gerou insatisfação em um povo historicamente submisso as decisões do governo, o qual agora "lava as mãos", se desobrigando em continuar a fornecer rações para a população. Agora os mercados, antes vistos como ilegais, embora tolerados por necessidade, estão legalizados oficialmente. É a livre iniciativa se impondo e cobrindo o espaço de um poder estatal falido.


A distribuição de rações foi suspensa pelo governo em abril, em todas as províncias e até para todas as classes da sociedade, mesmo para os que residem em Pyongyang. A última distribuição foi uma cota prevista para durar 20 dias para cada norte-coreano, feita no dia 15 de abril, aniversário de nascimento do "grande líder"  Kim Il Sung.

Essas mudanças um aspecto positivo. É o fim, na prática, do monopólio estatal de todas as atividades econômicas, até então rigorosamente defendido pelo socialismo jucheísta. Já a alguns anos, os mercados vinham se impondo, embora sofrendo constantes restrições. Mas o pragmatismo derrotou o dogmatismo ideológico. Ou isso ou mais mortalidade em massa de norte-coreanos por inanição.


Trata-se de uma solução que deveria ter sido aplicada já nos anos noventa, logo após o falecimento do presidente Kim Il Sung, em 1994. A Coréia do Norte entrou naquele ano, no que a população do país chama hoje de a GRANDE TRIBULAÇÃO, um período de cerca de quatro anos que teve no mínimo um milhão de mortos por causa da fome. Fala-se até em três milhões, mas os números exatos são desconhecidos.

 Nessa época, ficou famosa a cena na qual uma apresentadora da TV norte-coreana mostrou imagens de ervas daninhas "comestíveis", as quais, de acordo com a reportagem, podiam ser encontradas com facilidade em terrenos baldios. Era o alerta do início da catástrofe. Pessoas devoraram os próprios animais de estimação, passaram a caçar cobras, ratos e outros animais nas florestas, comiam as cascas e até o miolo das árvores. E ocorreram muitos casos de canibalismo, com ataques a cadáveres e até assassinatos para o consumo de carne humana.

Foi uma tragédia construída por má gestão econômica, secas, enchentes e até pelo fato da área agrícola ser muito inferior a da Coréia do Sul. Grande parte do país é montanhoso, com invernos rigorosos, e possui apenas 16% do território com condições de cultivo.

Nos mercados é comum a venda de comida produzida na China, importada de lá, embora no princípio ela era contrabandeada. Dou um exemplo de como essa atividade começou. Foi assim:


Imaginemos, no final de 1994 (inverno), um jovem camponês, sem comida na sua cabana, e morador próximo da fronteira chinesa. Órfão (seus pais morreram em um campo de concentração, onde ele também ficou preso) e sozinho, resolve arriscar e atravessa o rio congelado que separa os dois países. Tinha uma namorada, mas ela não o acompanha, pois teme abandonar a família..


Do outro lado, arruma emprego na fazenda de um coreano étnico, ou seja, um Chinês da etnia coreana, que vive do outro lado da fronteira. Consegue um lugar para morar e alimento. Trabalha apenas por abrigo e comida. Passa o inverno lá e garante a sobrevivência. Na primavera, resolve voltar para a aldeia em que morava, para ver como estavam as pessoas que conhecia.


O cenário é de horror. Muita gente morreu, sendo que vários corpos foram devorados pelos poucos vivos, que estão desnutridos e sempre esfomeados. As autoridades não garantem uma distribuição regular de rações. O rapaz compreende que se ficar poderá morrer também, e resolve voltar para a China, acompanhado da magra namorada, que não quiz ir com ele, e viu a família toda falecer. Do outro lado, tentam continuar com as suas vidas.


Mas logo o rapaz pensa que talvez seja possível permanecer no próprio país. Ele houve falar de norte-coreanos que passam a trabalhar no contrabando, para sobreviver. Ele resolve recorrer a essa atividade, se juntando a uma quadrilha que leva comida para a Coréia do Norte. Ele e a namorada voltam, se casam, e se instalam na mesma aldeia em que viviam, com ele atravessando ocasionalmente a fronteira e ficando com uma fração dos produtos como pagamento. Meio sem saber, ele e a esposa vão se tornando mercadores, muito importantes em aliviar o drama da nação naquele período. Empreendedores motivados por uma rigorosa luta por sobrevivência, até odiados pelos governantes, embora necessários.

E agora as arrogantes lideranças do "paraíso dos trabalhadores" resolvem tolerar o empreendorismo, como forma de impedir a que os famintos, no limite da paciência, recorram a solução revolucionária para encerrar o pesadelo em que vivem.

E provavelmente por isso, que o regime estabelece outras formas de controle sobre a sociedade. Agentes de segurança pública começaram a confiscar facas, serras e outras armas que tenham mais de 9 centímetros de comprimento, em um esforço para conter o assassinato e outros crimes violentos. Veremos no futuro o resultado dessas mudanças.

Fonte de algumas das informações para elaboração desta postagem : Blog do Leonid Petrov

Um comentário:

Marcelo disse...

Gostaria de fazer umas considerações sobre o Rodeio. Sabemos que não é o tipo de coisa que resolve o turismo em Peruíbe. Mas digamos que o objetivo fosse atrair turistas:
1º) Que sonoro, elegante, bonito que é falar ao turista: "Fica na Vila Erminda"
2º) Que grandes benefícios trará um evento em que o turista sequer precisa entrar na cidade, não vai conhecer nem o comércio, nem a praia, nenhum ponto turístico, nada. Coisa de gênio!